Gaudete et exsultate


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 ALEGRAI-VOS E EXULTAI!

Uma leitura da Exortação Apostólica do Papa Francisco sobre a santidade

Pe. Geraldo dos Reis Maia1


Introdução


Como falar de santidade no mundo contemporâneo, numa cultura permeada de 

egoísmo, individualismo, subjetivismo, narcisismo, consumismo, voluntarismo, 

e autorreferencialidade? A santidade ainda interessa a alguém? A quem interessa 

a santidade? Essas questões dramáticas, apresentadas pelo ser humano da pós-

modernidade, se tornam um desafio para a espiritualidade cristã. Somos 

chamados a buscar uma resposta satisfatória, que convença a humanidade sobre 

a beleza e o encanto de se viver a santidade no mundo atual.

A cultura pós-moderna, com todas as suas vantagens e fascínios, tem uma forte 

vertente fragmentária, acentuadamente emocional, provisória, voltada à 

autonomia da subjetividade, sob o risco do subjetivismo. Nessa cultura da

provisoriedade, vulnerável a todos os afetos e relações, o hedonismo é alastrado 

e o consumismo permeia todos os interesses, em meio ao risco de um laxismo 

moral e relativismo acentuado. Faltam referenciais ao ser humano, que possam 

garantir-lhe estabilidade emocional, afetiva e espiritual.

―Alegrai-vos e exultai!‖. Este é o título da Exortação Apostólica do Papa 

Francisco ―sobre o chamado à santidade‖, datado de 19 de março de 2018. No 

original em latim o documento ficou conhecido como ―Gaudete et Exsultate‖ 

(GE). O Papa toma como título de seu documento uma citação de Mt 5,12, 

referida aos que são perseguidos ou humilhados por causa de Jesus Cristo. ―O 

Senhor pede tudo e, em troca, oferece a vida verdadeira, a felicidade para a qual 

fomos criados. Quer-nos santos e espera que não nos resignemos com uma vida 

medíocre, superficial e indecisa‖ (GE,1).

Duas nuances são importantes para melhor compreender a visão do Papa 

Francisco sobre a santidade. A primeira é tomar a alegria cristã, recorrente nos 

seus vários documentos, como o fundamento de um convite a acolher a 

misericórdia de Deus e aceitar ser portador do testemunho para uma vida de 

santidade. A segunda é superar uma concepção estática da vocação humana e 

 

1

Pe. Geraldo dos Reis Maia nasceu em Delfinópolis (MG), aos 03.05.1964. Foi ordenado presbítero 

no dia 08.12.1988 e pertence ao presbitério da Arquidiocese de Uberaba. É Mestre em Teologia 

Dogmática pela FAJE (BH) e Doutor pela PUG (Roma). É Reitor do Pontifício Colégio Pio 

Brasileiro        (Roma), desde 30.09.14.



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adotar uma concepção dinâmica, no sentido já entendido no cânon 12 do 

Concílio de Orange (529). Diante da crise pelagiana, assim afirmou aquele 

concílio: ―Deus nos ama não pelos nossos méritos, mas por aquilo que nos 

tornamos pela sua graça‖2

.

O intuito do documento não é fazer um tratado sistemático sobre a santidade, 

com muitas definições e distinções... O seu objetivo é humilde: ―fazer ressoar 

mais uma vez o chamado à santidade, procurando encarná-la no contexto atual, 

com os seus riscos, desafios e oportunidades, porque o Senhor escolheu cada um 

de nós ‗para sermos santos e íntegros diante dele, no amor‘ (Ef 1,4)‖ (GE,2)3

. O 

desejo do Papa é envolver narrativamente o leitor, no intuito de ativar no seu 

coração o desejo da conversão e discernir, auscultando a própria vocação à 

santidade. Assim, o documento se apresenta como um colóquio simples e 

concreto sobre o que fazer para ser santo4

.

É importante conhecer algumas principais matrizes da espiritualidade 

bergoliana. A concepção de espiritualidade para o Papa Francisco está 

relacionada à ―Teologia do Povo de Deus‖, que influenciou todo o seu 

pensamento5

. Nessa perspectiva, Bergoglio fala de uma ―classe média da 

santidade‖, que é a santidade ordinária, colocada à disposição de todo o Povo de 

Deus e não somente de uma elite (GE 7). Trata-se de um tema inspirado em

Joseph Malègue6

. Outro grande inspirador do Papa jesuíta não podia deixar de 

ser Santo Inácio de Loyola, com os seus exercícios espirituais7

. Francisco tem, 

ainda, como referência o seu mestre jesuíta de vida espiritual Pe. Miguel Ángel 

Fiorito, que deixou um grande legado sobre o tema do discernimento8

.

 

2 Cf. J.-M., AVELINE, ―Préface‖, in VV.AA., Soyez dans la joie et l‘allégresse, Paris: Christus Lessius, 

2018, 5-6.

3 Ainda que o Papa Francisco se concentre em duas citações do Evangelho de Mateus, no terceiro 

capítulo, o fundamento de toda a Exortação é Ef 1,4; cf. A. PEREIRA DELGADO, ―Santos e intachables. 

Efesios 1,4 como fundamento de la Gaudete et Exsultate‖, Isidorianum 54 (2018) 247-248.

4 Cf. A. STAGLIANÒ, ―Commento: La santità ‗misura alta‘ della vita ‗ordinaria‘ del Cristiano‖, in 

PAPA FRANCESCO, Gaudete et Exsultate, Libreria Editrice Vaticana, Vaticano, 2018, 5. Cf. também T. 

GARVAN ORELLANA, ―Sobre la exhortación apostólica Gaudete et Exsultate del Papa Francisco. Una 

breve presentación‖, Revista Teologica Limense, LII (2018) 94.

5 Cf. A. SPADARO, ―Gaudete et Exsultate. Radice, struttura e significato della Esortazione apostolica di 

papa Francesco‖, La Civiltà Cattolica, 169 (2018/II) 110-111.

6 Cf. R. SCHOLTUS, ―Présentation Générale: La sainteté pour tous‖, in VV.AA., Soyez dans la joie et 

l‘allégresse, Paris: Christus Lessius, 2018, 11. Cf. também A. SPADARO, ―Gaudete et Exsultate. 

Radice, struttura e significato…‖, op. cit., 109; U. SARTORIO, Santità per tutti: Una lettura 

dell‘esortazione apostolica Gaudete et Exsultate, Milano: Àncora, 2019, 18-20.

7 Cf. A. SPADARO, ―Gaudete et Exsultate. Radice, struttura e significato…‖, op. cit., 119.

8 Cf. A. SPADARO, ―Gaudete et Exsultate. Radice, struttura e significato…‖, op. cit.,120.



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A Exortação Gaudete et Exsultate é dividida em cinco capítulos e 177 

parágrafos. Trata-se de uma obra de arte, que nos convida não somente à sua 

leitura, mas, também e principalmente, à sua contemplação. Contemplar uma 

obra de arte exige muita atenção, reflexão e concentração, que nos permitem 

visualizar o todo e as partes, sem perder o encanto que a obra gera em nós. 

Assim como entramos numa catedral e nos deparamos com seus vitrais e 

afrescos, adentremos nesse documento. Propomos, a modo de itinerário de 

leitura da Gaudete et Exsultate, o percurso de entrada numa catedral. Tomemos 

cada capítulo como um vitral a ser visualizado e contemplado: o chamado, dois 

sutis inimigos, à luz do Mestre, características da santidade, a luta com 

vigilância e discernimento.

1. Primeiro vitral: O chamado à santidade

O primeiro vitral que contemplamos é o chamado à santidade. Na linha do 

Capítulo V da Constituição Dogmática do Vaticano II, Lumen Gentium, o Papa 

Francisco nos recorda que todos os cristãos são chamados à vida de santidade e 

desenvolve esse tema9

. Com várias citações bíblicas, o documento faz um 

percurso da beleza da santidade segundo a Palavra de Deus: ―A santidade é o 

rosto mais belo da Igreja‖ (GE,9)10. O aspecto comunitário da santidade tem 

grande relevância: ―O Senhor, na história da salvação, salvou um povo. Não há 

identidade plena sem pertença a um povo. Por isso, ninguém se salva sozinho, 

como indivíduo isolado, mas Deus atrai-nos tendo em conta a complexa rede de 

relações interpessoais que se estabelecem na comunidade humana‖ (GE,6).

O Papa Francisco nos dá uma bela definição do que é a santidade: ―é viver em 

união com Ele (Jesus Cristo) os mistérios de sua vida; consiste em associar-se de 

uma maneira única e pessoal à morte e ressurreição do Senhor, em morrer e 

ressuscitar continuamente com ele‖ (GE,20). Santidade é estar inserido no 

seguimento de Jesus Cristo. É configurar a sua vida na vida mesma dele. 

Seria a santidade um fechamento da pessoa diante do mundo e da história, com 

seus desafios e inquietações? O Papa passa a tratar da relação de santidade e 

 

9

―A vocação à santidade é para todos, mas ela se junta a cada um, naquilo que há de singular e de 

único‖. M. FÉDOU, ―Postface: Le chemin de la sainteté‖, in VV.AA., Soyez dans la joie et l‘allégresse, 

Paris: Christus Lessius, 2018, 141-142. Cf. também A. NUGNES, ―Ripartire dalla santità. Un invito alla 

lettura di Gaudete et Exsultate‖, Rassegna di Teologia 59 (2018) 368; T. GARVAN ORELLANA, ―Sobre 

la exhortación apostólica‖, op. cit., 93.

10 Sobre o conceito de ser santo, cf. A. PEREIRA DELGADO, ―Santos e intachables...‖, op. cit., 254-263.



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atividade. ―Dado que não se pode conceber Cristo sem o Reino que Ele veio 

trazer, também a tua missão é inseparável da construção do Reino (...). A tua 

identificação com Cristo e os seus desígnios requer o compromisso de 

construíres, com Ele, este Reino de amor, justiça e paz para todos‖ (GE,25). 

Trata-se do caráter da santidade inserida no mundo para transformá-lo, segundo 

a ordem desejada por Deus. Bem na inspiração de contemplação e ação,

buscando uma síntese entre atividade e espiritualidade, o Papa assim se 

expressa:

―Não é saudável amar o silêncio e esquivar o encontro com o outro, desejar o 

repouso e rejeitar a atividade, buscar a oração e menosprezar o serviço. Tudo 

pode ser recebido e integrado como parte da própria vida neste mundo, entrando 

a fazer parte do caminho de santificação. Somos chamados a viver a 

contemplação mesmo no meio da ação, e santificamo-nos no exercício 

responsável e generoso de nossa missão‖ (GE,26).

O Papa Francisco estimula todo o povo de Deus a trilhar o caminho da 

santidade: ―Não tenhas medo da santidade (...). Cada cristão, quanto mais se 

santifica, tanto mais fecundo se torna para o mundo (GE,32). E o Papa segue 

ensinando os cristãos a se enveredarem por esse caminho, de forma destemida: 

―Não tenhas medo de apontar para mais alto, de te deixares amar e libertar por

Deus. Não tenhas medo de te deixares guiar pelo Espírito Santo. A santidade 

não te torna menos humano, porque é o encontro da tua fragilidade com a força 

da graça‖ (GE,34). Aqui o Papa constrói uma espécie de itinerário espiritual que 

parte de uma releitura histórica dos santos que nos encorajam e nos 

acompanham. Vai ele traçando perspectivas de santidade no mundo 

contemporâneo11

.

2. Segundo vitral: dois inimigos sutis da santidade

O Papa Francisco nos apresenta, neste segundo vitral, ―dois inimigos sutis da 

santidade‖: o gnosticismo e o pelagianismo, que são ―duas falsificações da 

santidade‖12

. Nota-se aqui uma estreita ligação com a Carta da Congregação 

 


11 Cf. V. LE CHEVALIER e P. SEVEZ, ―Présentation‖, in VV.AA., Soyez dans la joie et l‘allégresse, 

Paris: Christus Lessius, 2018, 27.

12 A doutrina e a prática da Igreja, relativas à nossa compreensão limitada da verdade recebida do 

Senhor, são susceptíveis de interpretações diversas. Cf. A. WELLENS, ―Présentation‖, in VV.AA., 

Soyez dans la joie et l‘allégresse, Paris: Christus Lessius, 2018, 49.



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para a Doutrina da Fé Placuit Deo13

. Vamos nos ater a essas duas heresias, que 

já foram ocasião de muita reflexão ao longo do cristianismo e que agora 

retornam com novas tonalidades, em perspectiva de espiritualidade14

.

O gnosticismo surgiu nos primórdios do cristianismo. A origem do termo vem 

de ―gnose‖ (conhecimento, em grego). Santo Ireneu de Lião, dentre outros 

grandes pensadores da Antiguidade, combateu essa heresia, já na segunda 

metade do segundo século. Os formuladores e defensores do gnosticismo 

propunham uma salvação baseada num conhecimento espiritualizante, que se 

distanciava da corporalidade e materialidade. Era uma proposta de um 

cristianismo desencarnado da realidade, um Cristo que não levava consigo as 

marcas da encarnação na história15

.

O Papa já havia tratado deste tema anteriormente, afirmando, na sua primeira 

exortação Apostólica, que o gnosticismo supõe ―uma fé fechada no 

subjetivismo, onde apenas interessa uma determinada experiência ou uma série 

de raciocínios e conhecimentos que supostamente confortam e iluminam, mas, 

em última instância, a pessoa fica enclausurada na imanência da sua própria 

razão ou dos seus sentimentos‖ (EG, 94). Numa de suas homilias ele afirmou 

que ao desencarnar o mistério, os gnósticos preferem ―um Deus sem Cristo, um 

Cristo sem Igreja, uma Igreja sem povo‖16. Isto porque os gnósticos ―concebem 

uma mente sem encarnação, incapaz de tocar a carne sofredora de Cristo nos 

outros, engessada em uma enciclopédia de abstrações‖ (GE, 37).

Segundo o Papa Francisco, o gnosticismo ―é uma das piores ideologias, pois, ao 

mesmo tempo que exalta indevidamente o conhecimento ou uma determinada 

experiência, considera que a sua própria visão da realidade seja a perfeição. (...) 

o gnosticismo, por sua natureza, quer domesticar o mistério, tanto o mistério de 

Deus e da sua graça, como o mistério da vida dos outros‖ (GE, 40). Continua o 

Papa: ―Deus supera-nos infinitamente, é sempre uma surpresa e não somos nós 

que determinamos a circunstância histórica em que o encontramos, já que não 

 

13 Placuit Deo, documento da Congregação para a Doutrina da Fé foi lançado menos de um mês antes 

da Gaudete et Exsultate, a 22 de fevereiro de 2018.

14 Bem no início de seu pontificado, o Papa Francisco já havia intuído a reincidência dessas duas 

heresias, que retornam com novo vigor. Assim se expressou: ―E isto ilumina-nos ainda hoje, neste 

mundo onde se nega o homem, onde se prefere trilhar o caminho do gnosticismo, a vereda do 

pelagianismo, ou da «ausência da carne» — um Deus que não se fez carne — ou ainda da «ausência 

de Deus» — o homem prometeico que pode ir em frente‖ (Discurso aos participantes da Diocese de 

Brescia, 22.06.2013).

15 Para uma visão sobre os termos gnose e gnosticismo no contexto desta Exortação Apostólica, cf. U.

SARTORIO, Santità per tutti..., op. cit., 46-47.

16 Papa Francisco, homilia 17.11.2016.



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dependem de nós o tempo, nem o lugar, nem a modalidade do encontro. Quem 

quer tudo claro e seguro, pretende dominar a transcendência de Deus‖ (GE, 

41)17

.

O segundo inimigo sutil da espiritualidade, segundo o Papa Francisco, é o 

pelagianismo. O temo tem origem em Pelágio, nome de um monge que viveu na 

Bretanha na passagem do IV para o V século e desenvolveu uma ideia de 

salvação baseada na vontade humana e no esforço pessoal, desprovida da graça 

e da ação divina. Esta ideia se aprofundou com outros pensadores que se 

esqueceram da palavra do Apóstolo Paulo: ―a escolha de Deus não depende da 

vontade ou dos esforços do ser humano, mas somente de Deus que usa de 

misericórdia‖ (Rm 9,16), ou que Ele ―nos amou primeiro‖ (1Jo 4,19)18

.

Santo Agostinho de Hipona, dentre outros, combateu o pelagianismo. Com o 

passar do tempo, essa concepção de cristianismo retornou, em camadas 

diversificadas e o tema foi objeto de vários estudos e debates em concílios. O 

Concílio de Trento (1545 a 1563) se debruçou sobre a temática da salvação e da 

graça, no contexto do debate da Reforma Protestante sobre a justificação. Nos 

textos desse concílio encontramos uma bela síntese entre graça, justificação e 

obras humanas. Nos tempos de pós-modernidade, a temática retorna com toda 

potencialidade, na forma do voluntarismo19

.

O Papa descreve novas formas de pelagianismo que surgem hoje, como rejeição 

da ação da graça na vida humana: ―a obsessão pela lei, o fascínio de exibir 

conquistas sociais e políticas, a ostentação no cuidado da liturgia, da doutrina e 

prestígio da Igreja, a vanglória ligada à gestão de assuntos práticos, a atração 

pelas dinâmicas de autoajuda e realização autorreferencial‖ (GE, 57). Continua o 

Papa: ―Sem nos darmos conta, pelo fato de pensar que tudo depende do esforço 

humano canalizado através de normas e estruturas eclesiais, complicamos o 

Evangelho e tornamo-nos escravos de um esquema que deixa poucas aberturas 

para que a graça atue‖ (GE, 59)20

.

 

17 O gnosticismo que estigmatiza o Papa Francisco é, desse ponto de vista, o outro nome de elitismo 

narcísico e orgulhoso daqueles cristãos que distanciam Deus da realidade humana e submetem ao seu 

próprio controle sua graciosa imprevisibilidade. Cf. R. SCHOLTUS, ―Présentation Générale...‖, op. cit., 

13.

18 Os pelagianos ou semipelagianos subordinam a ação de Deus à vontade humana. Colocam a graça 

num segundo plano. Cf. R. SCHOLTUS, ―Présentation Générale...‖, op. cit., 13.

19 Para uma visão sobre o pelagianismo no contexto desta Exortação Apostólica, cf. U. SARTORIO, 

Santità per tutti..., op. cit., 50-56.

20 Ainda sobre esses dois inimigos sutis, Cf. A. SPADARO, ―Gaudete et Exsultate. Radice, struttura e 

significato...‖, op. cit., 109.



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Esses dois reducionismos, frutos do individualismo e do subjetivismo, culminam 

numa última heresia, o catolicismo convencional. Trata-se da alienação 

religiosa, onde se reza, mas não se opera a caridade, onde se invoca Deus e não 

se obedece ao seu mandamento do amor, onde se pede misericórdia e não se 

perdoa21. Este é um ―catolicismo esvaziado de cristianismo‖. No fundo, as duas 

heresias se referem a uma mesma atitude: o ser humano se arroga um poder 

indevido, seja no nível da inteligência ou do saber, ou no nível da ação22

. Assim 

o Papa conclui a sua apresentação sobre este tema: ―Que o Senhor liberte a 

Igreja das novas formas de gnosticismo e pelagianismo que a complicam e 

detêm no seu caminho para a santidade‖ (GE, 62)23

.

M. Gronchi assim resume o pensamento do Papa Francisco sobre os neo-

gnósticos: ―concebem uma mente sem Deus e sem carne (cf. GE 37-39), uma 

doutrina sem mistério (cf. GE 40-42), desprezando a simplicidade concreta do 

Evangelho e se creem melhores do que a ‗massa ignorante‘ (cf. GE 43-46)‖24

Além de se colocarem fora da realidade histórica, onde o Evangelho deve ser 

encarnado pelo testemunho dos cristãos, os gnósticos são soberbos e 

presunçosos, acreditam fazer parte de uma elite de salvação, com base na sua 

inteligência e no seu conhecimento. De outro lado, os neo-pelagianos 

―absolutizam o poder do esforço pessoal e da vontade sem humildade (cf. GE 

47-51)‖25

.

Francisco apresenta, nos parágrafos 57 e 58 as novas formas de pelagianismo 

que continuam a desenvolver-se nos dias de hoje: a adoração da vontade 

humana, a obsessão pela lei, a ostentação no cuidado da liturgia, da doutrina ou 

do prestígio da Igreja, a importância excessiva que é dada à observância de 

normas

26

.

O caminho de superação dessas tão antigas e tão novas heresias é de mão dupla. 

De um lado, é preciso fidelidade à carne de Jesus Cristo, nas suas chagas que 

permanecem impressas na humanidade vulnerável e ferida. De outro lado, é 

preciso persistir com clareza a confiança na grande gratuidade de Deus, que nos 

 

21 Cf. A. STAGLIANÒ, ―Commento: La santità...‖, op. cit., 10-11. 

22 Cf. M. FÉDOU, ―Postface: Le chemin de la sainteté‖, op. cit., 143.

23 A incidência sobre essas duas heresias está presente desde o início do ministério do Papa Francisco, 

o que ele costuma denominar ―mundanidade espiritual‖. Cf. U. SARTORIO, Santità per tutti…, op. cit.,

37-41.

24 M. GRONCHI, ―Introduzione‖, op. cit., 10.

25 M. GRONCHI, ―Introduzione‖, op. cit., 10.

26 Cf. M. FÉDOU, ―Postface: Le chemin de la sainteté‖, op. cit., 144.



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oferece a salvação sem mérito de nossa parte, revelando, assim, o sentido 

profundo do escândalo da cruz27

.

3. Terceiro vitral: À luz do Mestre

Contemplemos agora o terceiro vitral, denominado ―À luz do Mestre‖28. Aqui o 

Papa vai analisar a espiritualidade das bem-aventuranças, a partir de Mt 5,3-

1229. ―Nelas está delineado o rosto do Mestre, que somos chamados a deixar 

transparecer no dia a dia da nossa vida‖ (GE, 63). Para vivenciar as bem-

aventuranças, afirma o Papa, é preciso deixar ―o Espírito Santo nos permear com 

toda a sua força e nos libertar da fraqueza do egoísmo, da preguiça, do orgulho‖ 

(GE, 65).

A partir desta intuição, o Papa analisa cada uma das oito bem-aventuranças e vai 

delineando os caminhos da santidade a partir delas: ser pobre no coração, reagir 

com humilde mansidão, saber chorar com os outros, buscar a justiça com fome e 

sede, olhar e agir com misericórdia, manter o coração limpo de tudo o que 

mancha o amor, semear a paz ao nosso redor, abraçar diariamente o caminho do 

Evangelho mesmo que nos acarrete problemas. ―A medida suprema do 

Evangelho é, sem dúvida, a misericórdia‖

30, observa M. Gronchi.

A proposta do Papa nos orienta em direção a uma radicalidade cristã afirmativa 

e ativa, que não deve assustar ou desencorajar, mas cumular cada um de desejo e 

de energia espiritual: a bondade. Para viver essa bondade, o Papa convida a 

todos a acolher o apelo das bem-aventuranças, na sua originalidade, realidade e 

simplicidade, sem comentários31

.

A seguir, o Papa passa a concentrar-se numa das bem-aventuranças, aquela que 

declara felizes os misericordiosos. Iluminado pelo texto de Mt 25,31-46, 

Francisco nos adverte que ali se encontra uma regra de comportamento com 

base na qual seremos julgados (cf. GE, 95). Citando São João Paulo II, o Papa 

 

27 Cf. M. GRONCHI, ―Introduzione‖, op. cit., 20.

28 Trata-se do capítulo central da Exortação, Cf. A. SPADARO, ―Gaudete et Exsultate. Radice, struttura 

e significato…‖, op. cit., 116.

29 ―O Papa Francisco comenta as oito bem-aventuranças, na versão de Mateus, com estilo análogo 

àquele do hino da caridade de São Paulo no quarto capítulo de Amoris Laetitia‖. M. GRONCHI,

―Introduzione‖, op. cit., 11.

30 M. GRONCHI, ―Introduzione‖, op. cit., 12. Cf. também U. SARTORIO, Santità per tutti…, op. cit., 23-

27.

31 Cf. A-M, PELLETIER, ―Présentation‖, in VV.AA., Soyez dans la joie et l‘allégresse, Paris: Christus 

Lessius, 2018, 69.



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nos esclarece que esse texto das obras de misericórdia ―não é um mero convite à 

caridade, mas uma página de cristologia que projeta um feixe de luz sobre o 

mistério de Cristo‖ (NMI, 49). Isto porque ―neste apelo a reconhecê-lo nos 

pobres e atribulados, revela-se o próprio coração de Cristo, os seus sentimentos 

e as suas opções mais profundas, com as quais se procura configurar todo o 

santo‖ (GE, 96). Pode-se observar que ―a grande regra de comportamento, a que 

depende a santidade, é indicada por Jesus nas obras de misericórdia‖32

.

Francisco nos alerta para o risco das ideologias, que nos levam a dois erros 

nocivos. Um dos erros é separar ―estas exigências do Evangelho do seu 

relacionamento pessoal com o Senhor, da união interior com Ele, da graça‖ (GE, 

100). A partir dessa perspectiva, o risco é transformar o cristianismo numa 

espécie de ONG. De outro lado, há o risco ideológico ―das pessoas que vivem 

suspeitando do compromisso social dos outros, considerando-o algo de 

superficial, mundano, secularizado, imanentista, comunista, populista‖. 

Completa o Papa: ―Não podemos propor-nos um ideal de santidade que ignore a 

injustiça deste mundo‖ (GE, 101).

Neste ponto o Papa cita a situação dramática dos migrantes, fenômeno 

acentuado no mundo globalizado e ideologizado. Ainda que algumas correntes 

do catolicismo afirmem que se trata de tema secundário, Francisco o interpreta à 

luz de Mt 25,35, com os seguintes paralelos Ex 22,20; Lv 19,33-34 e Is 58,7-8 

(GE, 102-103). É a primeira vez que se fala com clareza sobre o tema de 

migração de massa num discurso sobre a santidade33

.

Francisco nos recorda que ―o critério de avaliação da nossa vida é, antes de mais 

nada, o que fizemos pelos outros‖ (GE, 104). E continua: ―o melhor modo para 

discernir se o nosso caminho de oração é autêntico será ver em que medida a 

nossa vida se vai transformando à luz da misericórdia‖. Assim completa o seu 

pensamento: ―a misericórdia é a plenitude da justiça e a manifestação mais 

luminosa da verdade de Deus. A misericórdia é a chave do céu‖ (GE, 105). A 

salvação não nos vem de sutis questões teológicas ou morais, mas pelo 

cumprimento de gestos concretos de misericórdia34

.

O Papa nos adverte para o risco do consumismo hedonista, que pode nos 

enganar: ―na obsessão de divertir-nos, acabamos por estar excessivamente 

concentrados em nós mesmos, nos nossos direitos e na exacerbação de ter tempo 

 

32 M. GRONCHI, ―Introduzione‖, op. cit., 13.

33 Cf. U. SARTORIO, Santità per tutti…, op. cit., 80.

34 Cf. U. SARTORIO, Santità per tutti…, op. cit., 75.



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livre para gozar a vida‖ (GE, 108). E afirma que ―o consumo de informação 

superficial e as formas de comunicação rápida e virtual podem ser um fator de 

estonteamento que ocupa todo o nosso tempo e nos afasta da carne sofredora dos 

irmãos‖ (GE, 108).

Francisco assim conclui este belo vitral: ―A força do testemunho dos santos 

consiste em viver as bem-aventuranças e a regra de comportamento do juízo 

final‖ (GE, 109). O Papa insiste que se trata de poucas e simples palavras, mas 

que são práticas e válidas para todas as pessoas, ―porque o cristianismo está feito 

principalmente para ser praticado e, se é também objeto de reflexão, isso só tem 

valor quando nos ajuda a viver o Evangelho na vida diária‖ (GE, 109). As bem-

aventuranças e o Juízo Final são os dois tratados essenciais do ensinamento 

trazido por Jesus. Importa acolher as palavras do Mestre e coloca-las em 

prática35

.

4. Quarto vitral: Características da santidade

O quarto vitral nos ajuda a analisar algumas características da santidade no 

mundo atual. O Santo Padre passa a recolher algumas características ou traços 

espirituais que são indispensáveis para ―compreender o estilo de vida a que o 

Senhor nos chama‖ (GE, 110). Francisco elenca cinco grandes manifestações do 

amor a Deus e ao próximo diante de alguns riscos e limites da cultura de hoje, 

tais como: ―a ansiedade nervosa e violenta que nos dispersa e enfraquece; o 

negativismo e a tristeza; a acédia cômoda, consumista e egoísta; o 

individualismo e tantas formas de falsa espiritualidade sem encontro com Deus 

que reinam no mercado religioso atual‖ (GE, 111).

A primeira das manifestações do amor de Deus e ao próximo que o Papa elenca 

é a trilogia ―suportação, paciência e mansidão‖, em outras palavras: permanecer 

centrado, firme em Deus que ama e sustenta36. Para isso, é preciso ter firmeza 

interior. Isto ―é obra da graça, impede de nos deixarmos arrastar pela violência 

que invade a vida social, porque a graça aplaca a vaidade e torna possível a 

mansidão do coração‖ (GE, 116). E o Papa continua: ―A humildade só se pode 

enraizar no coração através das humilhações. Sem elas não há humildade nem 

 

35 Cf. M. FÉDOU, ―Postface: Le chemin de la sainteté‖, op. cit., 146.

36 Nesse contexto, o Papa trata dos desafios da cultura mediática, como as ―fake news‖, através das 

quais se calunia as pessoas, podendo destruir a imagem alheia (cf. GE, 115). Cf. U. SARTORIO, Santità 

per tutti..., op. cit., 55.



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santidade. (...) A humilhação faz-te semelhante a Jesus, é parte ineludível da 

imitação de Jesus‖ (GE, 118)37

.

A segunda das manifestações é a ―alegria e sentido de humor‖. O Papa afirma 

que ―a alegria cristã é acompanhada pelo sentido do humor (...). O mau humor 

não é um sinal de santidade‖ (GE, 126)38. A terceira é a ―ousadia e ardor‖, uma 

espécie de ―impulso evangelizador que deixa uma marca neste mundo‖ (GE, 

129). Continua o Papa: ―Quantas vezes nos sentimos instigados a deter-nos na 

comodidade da margem! Mas o Senhor chama-nos a navegar pelo mar dentro e 

lançar as redes em águas mais profundas (Lc 5,4). Convida-nos a gastar a nossa 

vida ao seu serviço. Agarrados a ele, temos a coragem de colocar todos os 

nossos carismas ao serviço dos outros‖ (GE, 130). O Papa recorda-nos que Deus 

não tem medo, ele ultrapassa os esquemas e vai em direção à periferia. ―Ele 

próprio se fez periferia (Fl 2,6-8; Jo 1,14). Por isso, se ousarmos ir às periferias, 

lá o encontraremos: Ele já estará lá. Jesus antecipa-se no coração daquele irmão, 

na sua carne ferida, na sua vida oprimida, na sua alma sombria. Ele já está lá‖ 

(GE, 135)39

.

A quarta das manifestações propostas pelo Papa é a ―vida de comunidade‖. 

Francisco afirma: ―Partilhar a Palavra e celebrar juntos a Eucaristia torna-nos 

mais irmãos e vai nos transformando pouco a pouco em comunidade santa e 

missionária‖ (GE, 142). E continua: ―A comunidade, que guarda os pequenos 

detalhes do amor e na qual os membros cuidam uns dos outros e formam um 

espaço aberto e evangelizador, é lugar da presença do Ressuscitado que a vai 

santificando segundo o projeto do Pai‖ (GE, 145). E o Papa arremata, abordando 

o remédio contra a tendência para o individualismo consumista que acaba por 

nos isolar na busca do bem-estar à margem dos outros: ―o nosso caminho de 

santificação não pode deixar de nos identificar com aquele desejo de Jesus ‗que 

 

37 Trata-se de ser centrado, ancorado solidamente em Deus, configurado em Jesus Cristo. Cf. A.-M. 

AÏTKEN, e S. CARIOU-CHARTON, ―Présentation‖, in VV.AA., Soyez dans la joie et l‘allégresse, Paris: 

Christus Lessius, 2018, 97.

38 O senso de humor está ligado aqui à alegria, que é preservado da tristeza e da ingratidão. Cf. A.-M. 

AÏTKEN e S. CARIOU-CHARTON, ―Présentation‖, op. cit., 98. Cf. também U. SARTORIO, Santità per 

tutti…, op. cit., 88-91.

39 No texto aparece o termo grego ―parresia‖, que tem o sentido de coragem apostólica. Cf. A.-M. 

AÏTKEN e S. CARIOU-CHARTON, ―Présentation‖, op. cit., 98. É nesse sentido que o Papa fala de uma 

―cultura da proximidade‖, capaz de supercar toda autorreferencialidade para ir de encontro ao outro 

que nos interpela. Cf. U. SARTORIO, Santità per tutti…, op. cit., 93-94.



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todos sejam um só, como tu, Pai, estás em mim, e eu em ti‘ (Jo 17,21)‖ (GE, 

146)40

.

Por fim o Papa apresenta a quinta e última das manifestações do amor a Deus e 

ao próximo: ―em oração constante‖. Aqui, Francisco apresenta as características 

do santo: ―uma pessoa com espírito orante, que tem necessidade de comunicar-

se com Deus. É alguém que não suporta asfixiar-se na imanência fechada deste 

mundo e, no meio dos seus esforços e serviços, suspira por Deus, sai de si 

erguendo louvores e alarga os seus confins na contemplação do Senhor‖ (GE, 

147)41

.

Fechando esse vitral com chave de outro, o Papa Francisco nos diz o que é a 

oração confiante: ―é uma resposta do coração que se abre a Deus face a face, 

onde são silenciados todos os rumores para escutar a voz suave do Senhor que 

ressoa no silêncio‖ (GE, 149).

5. Quinto vitral: Luta, vigilância e discernimento

O quinto e último vitral trata de três elementos importantes na espiritualidade: 

―luta, vigilância e discernimento‖. Trata-se de um acento dramático sobre a vida 

cristã: aceitar a lógica da cruz e viver a alegria prometida42

. Assim o Papa inicia 

a parte conclusiva desta sua obra: ―A vida cristã é uma luta permanente. Requer-

se força e coragem para resistir às tentações do demônio e anunciar o 

Evangelho. Esta luta é magnífica, porque nos permite cantar vitória todas as 

vezes que o Senhor triunfa na nossa vida‖ (GE, 158).

Francisco vai discorrendo o sentido da existência do Maligno e sua presença no 

mundo e nos lembra que ―o demônio não precisa de nos possuir. Envenena-nos 

com o ódio, a tristeza, a inveja, os vícios‖ (GE, 161)43. Justamente por isso, ―o 

nosso caminho para a santidade é também uma luta constante‖ (GE, 162). As 

armas poderosas que o Senhor nos fornece para travar essa luta são: ―a fé que se 

expressa na oração, a meditação da Palavra de Deus, a celebração da Missa, a 

adoração eucarística, a Reconciliação sacramental, as obras de caridade, a vida 

 

40 O Papa nos faz ver que é nos detalhes do amor, nas relações da vida em comunidade, que se pode 

dar uma experiência mística. Cf. A.-M. AÏTKEN e S. CARIOU-CHARTON, ―Présentation‖, op. cit., 98.

41 A oração é um ―fazer memória‖, é escuta, adoração e escuta da Palavra de Deus. Cf. A.-M. AÏTKEN

e S. CARIOU-CHARTON, ―Présentation‖, op. cit., 98.

42 Cf. ANNE-CLAIR e LANGLOIS, Christophe, ―Présentation‖, in VV.AA., Soyez dans la joie et 

l‘allégresse, Paris: Christus Lessius, 2018, 125.

43 Sobre o sentido de demônio, diabo, satanás, cf. U. SARTORIO, Santità per tutti..., op. cit., 103.



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comunitária, o compromisso missionário‖ (GE, 162). Outros três elementos 

importantes nesta luta contra o Maligno e caminho de santidade são ―o 

progresso do bem, o amadurecimento espiritual e o crescimento do amor‖ (GE, 

163).

Para o Papa, ―o caminho da santidade é uma fonte de paz e alegria que o

Espírito nos dá‖ (GE, 163). Esse caminho se contrapõe à corrupção espiritual, 

caracterizada como sendo ―pior que a queda de um pecador, porque se trata de 

uma cegueira cômoda e autossuficiente, em que tudo acaba por parecer lícito: o 

engano, a calúnia, o egoísmo e muitas formas sutis de autorreferencialidade‖ 

(GE, 165).

Por fim, Francisco trata do discernimento, tema fundamental não só para 

concluir esse documento, mas porque é recorrente em todo o seu ministério, 

tornando-se característico do pensamento do Papa Bergoglio. Para ele, o 

discernimento é ―um dom que é preciso pedir‖ (GE, 166). E nos adverte: ―sem a 

sapiência do discernimento, podemos facilmente transformar-nos em marionetes 

à mercê das tendências da ocasião‖ (GE, 167). Por isso, é muito razoável seguir 

a orientação do Apóstolo: ―examinai tudo e guardai o que é bom‖ (1Ts 5,21). O 

Papa recorda-nos que o discernimento é importante porque nos leva ―a 

reconhecer os meios concretos que o Senhor predispõe, no seu misterioso plano 

de amor, para não ficarmos apenas pelas boas intenções‖ (GE, 169).

Por ser uma graça, o discernimento ―não requer capacidades especiais nem está 

reservado aos mais inteligentes e instruídos; o Pai compraz-se em manifestar-se 

aos humildes (Mt 11,25)‖ (GE, 170). O Papa fala de um discernimento orante, 

que exige partir de uma predisposição para escutar. ―Somente quem está 

disposto a escutar é que tem a liberdade de renunciar ao seu ponto de vista 

parcial e insuficiente, aos seus hábitos, aos seus esquemas‖ (GE, 172). Ele fala 

também de um discernimento dos espíritos, ―que nos liberta da rigidez, que não 

tem lugar no ‗hoje‘ perene do Ressuscitado. Somente o Espírito sabe penetrar 

nas dobras mais recônditas da realidade e ter em conta todas as suas nuances, 

para que a novidade do Evangelho surja com outra luz‖ (GE, 173)44

.

 

44 O discernimento é uma graça a ser pedida e recebida na oração e na escuta do Evangelho, a graça de 

uma confiante disponibilidade ao Espírito. Cf. R. SCHOLTUS, ―Présentation Générale...‖, op. cit., 18. 

Cf. também T. GARVAN ORELLANA, ―Sobre la exhortación apostólica...‖, op. cit., 97-98; C. STERCAL,

―Una lettura dell‘esortazione apostolica...‖, op. cit., 544; A. SPADARO, ―Gaudete et Exsultate. Radice, 

struttura e significato…‖, op. cit., 119-122; U. SARTORIO, Santità per tutti…, op. cit., 105-121.



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Conclusão

Gaudete et Exsultate está em plena consonância doutrinal e pastoral com os 

demais documentos do Papa Francisco45. M. Gronchi fala de um poliedro da 

alegria, que une o Evangelho (Evangelii Gaudium), a família (Amoris Laetitia), 

a criação (Laudato Sì) e a santidade (Gaudete et Exsultate)

46. O toque de 

consonância é a alegria47. Essa alegria dada por Jesus nada tem a ver com as 

satisfações ocasionais e os prazeres efêmeros que o mundo oferece48. A ―‗alegria 

do Evangelho‘ é como um maná escondido (Ap 2,17), que pouco nutre os 

discípulos e os desperta de seu torpor para os enviar em missão‖49. A alegria 

paradoxal que provoca a leitura desse texto não deixa o seu leitor ileso50

.

Com a Exortação Apostólica Gaudete et Exsultate, o Papa Francisco relança o 

desafio mais alto do ser humano, aquele da santidade. Não se trata de uma 

santidade de gabinete, mas feita de pequenos gestos, numa via ao alcance de 

todos51. Todas as palavras do texto são um encorajamento a percorrer essa 

pequena via e não ter medo da santidade. Essa santidade que é acessível a todos 

pode mudar o mundo. Assim, as palavras de Francisco fazem os cristãos 

tomarem consciência dos valores de sua vida, de suas potencialidades interiores. 

O que Francisco propõe é um caminho bem diferente daquele autorreferencial, e 

centrado sobre o dinheiro e o poder52

.

A Exortação Apostólica nos apresenta um itinerário de espiritualidade. O ponto 

de partida é o chamado universal à santidade. O ponto de chegada é a exigência 

concreta de santidade no presente da história. Para passar do ponto de partida ao 

ponto de chegada, deve-se enfrentar os inimigos sutis que surgem nesse 

caminho, entrar na escola de Jesus, deixar-se ser ensinado por ele, colocar-se 

 

45 Cf. A. SPADARO, ―Gaudete et Exsultate. Radice, struttura e significato…‖, op. cit., 123.

46 Cf. M. GRONCHI, ―Introduzione‖, op. cit. , 5. Trata-se de um desenvolvimento da eclesiologia do 

Papa Francisco, cf. A. NUGNES, ―Ripartire dalla santità...‖ , op. cit., 359. Cf. também U. SARTORIO, 

Santità per tutti…, op. cit.,11-12.

47 Recordemos aqui dois documentos importantes que trazem o tema da alegria: Gaudete in Domino, 

do Papa Paulo VI, 1975. Cf. A. NUGNES, ―Ripartire dalla santità…‖, op. cit., 359. Outro documento 

importante, que reporta à alegria é Gaudet Mater Ecclesia, do Papa João XXIII, com a qual ele abriu o 

Concílio Vaticano II, em 11 de outubro de 1962. Cf. A. SPADARO, ―Gaudete et Exsultate. Radice, 

struttura e significato…‖, op. cit., 122-123.

48 Cf. R. SCHOLTUS, ―Présentation Générale…‖, op. cit., 16.

49 J.-M., AVELINE, ―Préface‖, op. cit., 8.

50 Cf. R. SCHOLTUS, ―Présentation Générale…‖, op. cit., 18.

51 A espiritualidade que o Papa Francisco nos propõe está cercada de um equilíbrio constitutivo entre 

união com Deus e dedicação ao próximo. Cf. C. STERCAL, ―Una lettura dell‘esortazione apostolica…‖, 

op. cit., 543.

52 Cf. L. SCARAFFIA, ―Commento‖, in PAPA FRANCESCO, Gaudete et Exsultate, Messaggero, Padova, 

2018, 99-101.



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efetivamente no seu seguimento, abrir-se à presença do Ressuscitado, bem como 

aos dons de seu Espírito53

.

Aos poucos vai se formando um vocabulário característico do Papa Francisco: o 

caminho, a estrada, dar o melhor de si. Este Papa é um peregrino que não se 

furta a conversar com os companheiros do caminho, sobre a estrada, sobre o 

modo de proximidade, sempre a nos ensinar54

.

A. Nunes nos apresenta três chaves em prospectiva transversal da Exortação 

Apostólica: a alegria, a salvação e a quotidianidade. A palavra alegria tem sido 

uma constante nos documentos do Papa Francisco, que não é um mero estado de 

espírito, mas pode ser considerado um critério apostólico. Essa alegria manifesta 

a relação entre Deus e a felicidade, que não é outra vida, mas uma vida outra, 

transformada pelas bem-aventuranças. Aí consiste o diferencial cristão diante do 

mundo55. A palavra salvação é repensada, no sentido de superar qualquer 

tentação de espiritualismo desencarnado e individualismo auto-redentor. Essa 

salvação tem uma perspectiva comunitária, por isso a espiritualidade é 

apresentada como um caminho comunitário. É no quotidiano que a 

espiritualidade se desenvolve e não em situações atípicas da existência56

.

A santidade de Deus foi cravada na cruz do seu Filho: aqui na condição da 

absoluta impotência histórica de Deus, ele mesmo se mostra absolutamente 

potente no amor; aqui onde Deus é mudo e abandonado, Deus lança ao mundo a 

palavra mais eloquente jamais dita sobre si mesmo. Assim, a medida da 

santidade cristã é o amor do Crucificado: Deus é assim santo – e separado do 

mundo, puro, justo, sem pecado – para poder receber desse mundo rebelde à sua 

santidade só a morte de cruz, sinal de quanto os seus pensamentos são 

verdadeiramente outros dos pensamentos dos homens57

. O mistério pascal se 

abraça a cada dia, nele somos imersos e sustentados. Trata-se de morrer e 

ressurgir continuamente com Jesus58

.

A espiritualidade supõe o seguimento de Jesus Cristo, viver em união com ele. 

Supõe unir-se à morte e ressurreição do Senhor, de modo único e pessoal (cf. 

 

53 Cf. M. FÉDOU, ―Postface: Le chemin de la sainteté‖, op. cit., 139-140. Cf. também C. STERCAL,

―Una lettura dell‘esortazione apostolica…‖, op. cit., 540. 542.

54 Cf. V. LE CHEVALIER e P. SEVEZ, ―Présentation‖, op. cit., 28.

55 Cf. A. SPADARO, ―Gaudete et Exsultate. Radice, struttura e significato…‖, op. cit., 122-123. O tema 

da alegria aparece cerca de 60 vezes no Documento de Aparecida, do qual Bergoglio foi o redator, cf. 

Ibid., 123. Sobre o tema da alegria nesta Exortação, cf. U. SARTORIO, Santità per tutti…, op. cit., 129.

56 Cf. A. NUGNES, ―Ripartire dalla santità…‖, op. cit., 360-367.

57 Cf. A. STAGLIANÒ, ―Commento…‖, op. cit., 17.

58 Cf. M. GRONCHI, ―Introduzione‖, op. cit., 8.



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GE 20)59

. No Mistério Pascal do Senhor, encontramos a origem da dimensão 

social da espiritualidade: a própria misericórdia que se torna exigência ética e 

que lança o cristão a um engajamento social e político pra a transformação do 

mundo60. Como Jesus Cristo entregou a sua vida para a salvação do mundo, 

assim o cristão batizado é chamado a doar-se pelos irmãos.

O Papa Francisco nos fala de uma espiritualidade encarnada, que procura seguir 

Jesus Cristo na carne. Nesse sentido, é preciso ter presente que a espiritualidade 

cristã é a raiz última e mística de toda ação caritativa61. Trata-se de uma nova 

encarnação do Verbo de Deus nas diversas formas da existência humana. 

Importa tocar a carne de Jesus Cristo nos irmãos mais necessitados. ―O santo é, 

então, o homem espiritual, que caminha segundo o espírito de Cristo e 

personaliza em si a forma de Cristo, tornando-se humano como o foi Jesus, em 

palavras e obras‖62. De uma espiritualidade da encarnação se passa à encarnação 

da espiritualidade. É a inserção do místico na realidade que o interpela63

.

Gaudete et Exsultate reconhece, na santidade cristã, a única verdadeira via para 

que a evangelização de hoje atinja o objetivo de sempre: apresentar ao vivo 

Jesus Cristo, esperança para o mundo, resposta de salvação para o ser humano, 

não importa a sua condição de necessitado. Mediante a vivência da santidade, o 

ser humano pode superar as esquizofrênicas tentações alienantes que humilham 

e mortificam a força da libertação histórica do Evangelho64

.

Em tempos de globalização, Francisco chama os cristãos não só a denunciar o 

drama de tantas injustiças sociais e problemas ecológicos, mas exige a prática 

profética de fazer alguma coisa contra a corrente, assinalando, na própria 

existência, uma conversão, com gestos concretos de mudança do modelo de 

vida. A proposta seria o deslocamento do testemunho da caridade para a 

caridade do testemunho, empenhando diretamente a vida na missão do 

Evangelho da caridade65. Por tudo isso, se pode perfeitamente afirmar que 

Francisco é um papa performativo66

.

Diante das provocações do mundo contemporâneo, Francisco nos propõe uma 

espiritualidade de dentro, encarnada, com os pés no chão, historicamente legível 

 

59 Cf. A. NUGNES, ―Ripartire dalla santità…‖, op. cit., 358.

60 Cf. R. SCHOLTUS, ―Présentation Générale…‖, op. cit., 15.

61 Cf. U. SARTORIO, Santità per tutti…, op. cit., 128.

62 A. STAGLIANÒ, ―Commento…‖, op. cit., 12.

63 Cf. C. STERCAL, ―Una lettura dell‘esortazione apostolica…‖, op. cit., 545.

64 Cf. A. STAGLIANÒ, ―Commento…‖, op. cit., 19-20.

65 Cf. A. STAGLIANÒ, ―Commento…‖, op. cit., 7-8.

66 Cf. R. SCHOLTUS, ―Présentation Générale…‖, op. cit., 18.



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mesmo num contexto que tende a torná-la opaca67. Trata-se de uma proposta de 

espiritualidade coerente com a força libertadora do Evangelho. É esta coerência 

que convence o ser humano sobre a beleza de se viver o chamado cristão à 

santidade. Não se trata de uma espiritualidade estanque, mas conectada a todas 

as dimensões do ser humano e suas relações.

O Papa Francisco nos presenteia com esta bela obra e nos chama a promover o 

desejo da santidade, um desejo que só o Espírito Santo pode despertar em nós e 

nos encaminhar para realizá-lo. Assim, Francisco conclui o seu precioso 

documento: ―Peçamos ao Espírito Santo que infunda em nós um desejo intenso 

de ser santos para a maior glória de Deus; e animemo-nos uns aos outros neste 

propósito. Assim, compartilharemos uma felicidade que o mundo não poderá 

tirar-nos‖ (GE, 177).



Bibliografia

AÏTKEN, Anne-Marie e CARIOU-CHARTON, Sylvain, ―Présentation‖, in VV.AA., 

Soyez dans la joie et l‘allégresse, Paris: Christus Lessius, 2018, 97-98.

ANNE-CLAIR e LANGLOIS, Christophe, ―Présentation‖, in VV.AA., Soyez dans la 

joie et l‘allégresse, Paris: Christus Lessius, 2018, 125.

AVELINE, Jean-Marc, ―Préface‖, in VV.AA., Soyez dans la joie et l‘allégresse, 

Paris: Christus Lessius, 2018, 5-8.

FÉDOU, Michel, ―Postface: Le chemin de la sainteté‖, in VV.AA., Soyez dans la 

joie et l‘allégresse, Paris: Christus Lessius, 2018, 139-149.

GARVAN ORELLANA, Tomás, ―Sobre la exhortación apostólica Gaudete et 

Exsultate del Papa Francisco. Una breve presentación‖, Revista Teológica 

Limense, LII (Enero / Abril 2018) 93-98.

GRONCHI, Maurizio, ―Introduzione‖, in PAPA FRANCESCO, Gaudete et Exsultate,

Libreria Editrice Vaticana, Vaticano, 2018, 5-20.

LE CHEVALIER, Valérie e SEVEZ, Pascal, ―Présentation‖, in VV.AA., Soyez dans 

la joie et l‘allégresse, Paris: Christus Lessius, 2018, 27-28.

 

67 U. SARTORIO, Santità per tutti…, op. cit., 12.



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NUGNES, Armando, ―Ripartire dalla santità. Un invito alla lettura di Gaudete et 

Exsultate‖, Rassegna di Teologia 59 (2018) 357-371.

PAPA FRANCISCO, Gaudete et exsultate. Sobre a chamada à santidade no mundo 

atual, Brasília: Edições CNBB, 2018.

PELLETIER, Anne-Marrie, ―Présentation‖, in VV.AA., Soyez dans la joie et 

l‘allégresse, Paris: Christus Lessius, 2018, 69-70.

PEREIRA DELGADO, Álvaro, ―Santos e intachables. Efesios 1,4 como fundamento 

de la Gaudete et Exsultate‖, Isidorianum 54 (2018) 247-263.

SARTORIO, Ugo, Santità per tutti: Una lettura dell‘esortazione apostolica 

Gaudete et Exsultate, Milano: Àncora, 2019.

SCARAFFIA, Lucetta, ―Commento‖, in PAPA FRANCESCO, Gaudete et Exsultate,

Messaggero, Padova, 2018, 99-101.

SCHOLTUS, Robert, ―Présentation Générale: La sainteté pour tous‖, in VV.AA., 

Soyez dans la joie et l‘allégresse, Paris: Christus Lessius, 2018, 9-18.

SPADARO, Antonio, ―Gaudete et Exsultate. Radice, struttura e significato della 

Esortazione apostolica di papa Francesco‖, La civiltà cattolica, 169 (2018/II) 

107-123.

STAGLIANÒ, Antonio, ―Commento: La santità ‗misura alta‘ della vita ‗ordinaria‘

del Cristiano‖, in PAPA FRANCESCO, Gaudete et Exsultate, Libreria Editrice 

Vaticana, Vaticano, 2018, 3-20.

STERCAL, Claudio, ―Una lettura dell‘esortazione apostolica Gaudete et 

exsultate‖, Teologia: rivista della facoltà teologica dell‘Italia settentrionale, 43 

(2018) 539-548.

WELLENS, Annie, ―Présentation‖, in VV.AA., Soyez dans la joie et l‘allégresse, 

Paris: Christus Lessius, 2018, 49-50.


*****


Consonância doutrinal da Gaudete et Exsultate com outros documentos do Papa Francisco.

O poliedro da alegria: 

! o Evangelho (Evangelii Gaudium), 

! a família (Amoris Laetitia), 

! a criação (Laudato Sì), 

! a santidade (Gaudete et Exsultate). 

O toque de consonância é a alegria. A alegria paradoxal que provoca a leitura desse texto não 

deixa o seu leitor ileso. Francisco relança o desafio mais alto do ser humano: da santidade. 

Não se trata de uma santidade de gabinete, mas feita de pequenos gestos, numa via 

ao alcance de todos.


*


Questões para trabalho em grupos:


1. Como fazer para tornar conhecido o chamado de todos os cristãos à santidade?

2. Aponte pistas para vencer os obstáculos no caminho da santidade hoje.

3. O que fazer para viver as bem-aventuranças e a caridade à luz do Mestre?

4. Como servir-se bem do discernimento à luz do Espírito Santo?


MCC do Brasil 

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